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2 de dez. de 2010

Eu descobri que tenho asas - 1ª parte


Até mesmo os saltos ao desespero podem trazer esperanças para um vida morta... basta estender o olhar e dar asas ao coração

"E no dia que tive o sobressalto sobre o meu nada, percebi que tudo mais não valia a pena. Pensei em algo que um amigo meu sempre dizia, em tom de brincadeira: " Se você morresse hoje, quantas pessoas iriam ao seu enterro?" Isso me gelava a espinha, não tinha nada de engraçado, afinal, ele era um forte, alguém dono de si, enquanto eu, dominada por minhas futilidades, era só alguém que temia um enterro vazio, vazio como era a minha vida seria assim também a minha morte."

Depois de tanto esmurrar as pontas de faca da vida e me ver embarreirada pelos inúmeros muros que se erguiam e me cercavam, decidi dar um basta. Eu estava cansada de deslocar minha alma em torno de novos projetos, já que os antigos se acumulavam como pilhas de papel mofado nos cantos de minha vida. Como partir para algo novo se tudo o que se tinha eram migalhas jogadas ao chão? Eu acreditava na felicidade, mas estava cansada de tentar, passei a achar ela um prêmio para os fortes, e eu não era forte, não desejava tentar novamente.
E no dia que tive o sobressalto sobre o meu nada, percebi que tudo mais não valia a pena. Pensei em algo que um amigo meu sempre dizia, em tom de brincadeira: " Se você morresse hoje, quantas pessoas iriam ao seu enterro?" Isso me gelava a espinha, não tinha nada de engraçado, afinal, ele era um forte, alguém dono de si, enquanto eu, dominada por minhas futilidades, era só alguém que temia um enterro vazio, vazio como era a minha vida seria assim também a minha morte.
Por isso cheguei à conclusão de que não havia mais sentido ou chance para minha existência. Havia parado para pensar tarde demais nas consequências de anos de escolhas pautados no prazer imediato e em interesses nada nobres, principalmente para mim, criada com tanto zelo e cercada de exemplos de luta e superação. Eu tinha fracassado e já via que passava da hora de ter ao menos uma decisão definitiva, eu livraria o mundo da pessoa estranha que eu era.
Foi então que decidi subir ao topo do prédio onde eu morava. Eu escolhi pular do ponto mais alto e torcer para morrer de pavor no momento da queda, antes de eu me despedaçar no chão de concreto frio. Seria uma morte rápida, simples para dar cabo do dilema que nem eu mesma suportava mais. Eu vivia quase todo o meu tempo sozinha, não faria falta a quase ninguém...
Mas mesmo decidida a pular, já em pé na sacada, eu sentia um desejo tão profundo de viver. O vento que soprava fazendo gelar o suor que escorria por todo o meu rosto e corpo me fazia vacilar, parecia cantar em meus ouvidos uma canção de esperança para os meus medos. Mas eu não voltaria atrás, afinal, voltaria para onde? Teria mais do mesmo que sempre tive? Não, a mão fria da morte me parecia mais amigável do que a mão estendida da felicidade, que eu nunca conseguiria alcançar! Eu ia pular e nada nem ninguém seria capaz de me impedir!
Foi então que eu fechei meus olhos e deixei fluir uma prece sorrateira de meu coração. Pedia perdão a Deus por desperdiçar a vida que tinha me concedido e por ter sido tão covarde em viver... Abri meus braços e, no desespero ao mesmo tempo calado e em um grito derradeiro, me lancei ao ar. Senti o amargo gosto da morte, o vento me forçando como uma barreira que aos poucos cedia para o fim de tudo, para o chão que selaria meu destino vazio... 
Enquanto aguardava o beijo cinza daquela que encomendaria minha alma ao mundo dos mortos, além do medo, senti uma forte dor em minhas costas. Pensei que fosse o fim, meus pulmões explodindo, mas era algo de dentro para fora. Brotaram de mim coisas pontudas e sedosas... elas se abriram em um gesto de força, me fazendo planar. Eu não havia morrido, eu não estou morta, eu descobri que tenho asas... 


Escrito por Edward de A. Campanário Neto

2 comentários:

Anônimo disse...

Mais uma vez seu conto me lembra uma canção...http://www.youtube.com/watch?v=nxhzmCUvkcU

Edward de A. Campanário Neto disse...

Como sempre digo, você tem o dom de materializar meus devaneios tão abstratos... de dar sentido ao que eu pensei não haver sentido por longos tempos, tempos tão diferentes do hoje.