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13 de jan. de 2011

Um mundo em crise

Nosso mundo não passa de um emaranhado onde sobrevivemos em espaços comprimidos por crises que passam e por crises que estão por vir.

"Mas até onde vai persistir este modelo? Será que já não há provas suficientes de que o modelo de economia de mercado já extrapolou com seus absurdos? A verdade é que provas há, já que as sucessivas crises se revelaram desastrosas o suficiente para temermos ainda mais os dias vindouros. Para que isso tenha clareza basta olhar as grandes crises ao longo da história do capitalismo e perceber que a incidência das mesmas é cada vez menos espaçada."

No cenário econômico o ano de 2010 se encerrou com um gosto amargo em meio ao cenário internacional. A crise de 2008 foi compelida com os mesmos métodos absurdos de sempre, sendo que estes, por fim, não foram capazes de freá-la o suficiente. Os trilhões de dólares e outras moedas lançados para conterem a crise trouxeram um inchaço monetário, criando um campo inflacionário fértil para os anos seguintes.  Além disso, foram também responsáveis pela acentuação da desvalorização do dólar, criando a chamada guerra cambial,  onde no cenário absurdo do jogo de disparidade entre moedas ninguém quer sair perdendo, ou perdendo mais que o vizinho, o que acabou gerando protecionismo comercial e industrial...
Analisando os efeitos das medidas extremas de impressão de dinheiro para  "contenção" da crise (pois, no fim, a ação de "irrigar o mercado" quase sempre está vinculada a fabricar dinheiro) fica claro que seus benefícios foram duvidosos e passageiros, deixando somente marcas de uma estrutura frágil e passível ao colapso a qualquer momento.
Indo além da alta impressão de moedas através da compra de títulos, outra ferramenta usada com toda força foi  a chamada "austeridade fiscal" que, sendo verdadeiramente exposta, não passa de um tremendo arrocho fiscal que aumenta os impostos, limita os serviços públicos, congela ou reduz salários e encabeça privatizações ou empréstimos impagáveis. Essa é a dura realidade dos países que cederam ao encanto da lógica do mercado como autor central e independente em uma economia e suas relações com as leis e o Estado.
Mas até onde vai persistir este modelo? Será que já não há provas suficientes de que o modelo de economia de mercado já extrapolou com seus absurdos? A verdade é que provas há, já que as sucessivas crises se revelaram desastrosas o suficiente para temermos ainda mais os dias vindouros. Para que isso tenha clareza basta olhar as grandes crises ao longo da história do capitalismo e perceber que a incidência das mesmas é cada vez menos espaçada.
Sendo fiel à história, pode-se dizer que a primeira grande crise do capitalismo foi ainda em seu berço, no século XVIII, a chamada bolha das tulipas, momento em que grandes comerciantes super-valorizaram as tulipas e investiram altas somas em seu cultivo e atividades a elas ligadas. Por fim, não havia sentido para tanto dinheiro investido, o que levou milhares de comerciantes e dependentes do comércio da flor irem à falência.
Após a bolha das tulipas, o nicho econômico atingido por uma grande crise foi a expansão ferroviária. O fato deu-se ao fim do século XIX, lançando à falência inúmeras empresas e gerando forte retração econômica na Europa Ocidental e EUA. Tal fato serviu para fortalecer o monopolismo, gerando uma nova lógica no capitalismo antes tão liberal e descontrolado.
Vale lembrar que a bolha das tulipas e a bolha ferroviária tiveram consequências localizadas no centro do capitalismo, já que a economia ainda não se encontrava interligada em grandes proporções. Ambas se deram pelo excesso de investimento e valorização artificial de um bem ou serviço.
A nível global, a crise deflacionária de super-produção de 1929 foi a maior e mais terrível. Sua ocorrência criou consequências profundas mundialmente, já que os EUA, atingido fortemente pela mesma, deixou de importar de países europeus e latino-americanos, gerando um ciclo de dificuldades econômicas que respingaram pouco a pouco, atingindo continentes inteiros. O período de recuperação foi longo, já que a estrutura econômica e social foi grandemente abalada.
A partir da década de 30 e o início do levante do chamado capitalismo neoliberal, a incidência de crises aumentou fortemente. Na década de 70 houve a crise do petróleo (apenas 40 anos depois da última crise); nos anos 80 houve estagnação em grande parte do mundo (menos de 10 anos depois da última crise); o início década de 90 foi marcado pela crise das dívidas externas dos países do chamado 3º mundo (para tanto, o período é conhecido economicamente como "A Década Perdida"); em 1997 o bloco do países latinos e asiáticos são atingidos por uma crise de fuga de capitais que teve início com a crise do México e culminou globalmente com a crise dos Tigres Asiáticos, lembrando que neste período o Brasil vivia a sangria do FMI e as privatizações (aqui nota-se expansão e "modernização econômica", mas a pobreza e desigualdade aumentou ou sequer foi mexida); em 2001 se inicia uma nova crise no mercado de capitais, dados os atentados de 11 de Setembro; e, por fim, em 2008 o mundo vê-se diante de uma crise de proporções e motivações semelhantes à crise de 1929. Nota-se que o intervalo entre as crises é cada vez menor, chegando a menos de 10 anos.
Tudo isso leva a crer que o mundo se encontra em um sistema que se reinventa a cada ciclo de crise, sendo que entre a fronteira de uma e outra há um pequeno grupo que se beneficia diante das medidas que sempre culminam com os prejuízos mais graves para as classes populares. Pode-se dizer que já se encontra em voga um modelo que sobrevive unicamente do avanço das crises econômicas.
O ano de 2011 se inicia com a dúvida de que a última crise não foi superada. A Europa sofre duras penas de estagnação e desemprego. Países como Portugal, Espanha, Irlanda e Grécia estão diante do desespero da explosão de suas dívidas, tendo que adotar as medidas que ferem sua população, que já sofrem com o desemprego e aumento da pobreza.
Gostaria eu de estar errado, mas os próximos anos serão marcados por uma etapa de transição para uma nova crise global. A mesma crise que se arrasta desde os anos 30: a crise da ganância humana em se dobrar diante da economia de livre mercado. A fé cega neste ídolo foi o grande indutor de todas as crises que, por fim, foram pagas ao custo do dinheiro das populações mais pobres, já que a classe abastada soube encontrar neste "divino deus mercado" seu diabólico lugar de descanso...        

Escrito por Edward de A. Campanário Neto

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