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4 de nov. de 2010

O que é guerra cambial?

A valorização (ou desvalorização) do dólar é o ponto chave em torno da guerra cambial entre inúmeros países

"Para compreender o cenário de guerra cambial que se desenha no meio internacional, é preciso antes haver a apropriação de conceitos sobre as relações cambiais, que são os fatores geradores de ações que provocam a chamada guerra. De forma bastante resumida, as relações cambiais podem ser consideradas a base de atuação dos países na gestão de suas economias e sua relação entre o patamar de sua moeda local com o dólar."

Guerra cambial. Este termo tem sido destaque nos noticiários durante a semana, fazendo parte, inclusive, de manifestações à imprensa da presidente eleita Dilma Rousseff, que nem chegou a assumir o poder. O assunto é dotado de polêmicas e envolve uma série de interesses de diversos países, principalmente o Brasil, que tem problemas de médio prazo que se desenvolvem devido à desvalorização excessiva do dólar, fruto claro de tal guerra.
Para compreender o cenário de guerra cambial que se desenha no meio internacional, é preciso antes haver a apropriação de conceitos sobre as relações cambiais, que são os fatores geradores de ações que provocam a chamada guerra. De forma bastante resumida, as relações cambiais podem ser consideradas a base de atuação dos países na gestão de suas economias e sua relação entre o patamar de sua moeda local com o dólar. 
O dólar é considerado, de forma consensual e por razões históricas e econômicas,  a moeda internacional de trocas, aquisição de empréstimos entre governos, negociações entre importadores e exportadores e diversas outras operações financeiras no mercado internacional. Dado isto, fica claro que tais operações dependem exclusivamente da variação do dólar dentro dos territórios de um país, o que torna necessário, primeiramente, a entrada da moeda na economia e uma cotação (valor) que corresponda às sua necessidades financeiras.
Partindo de exemplos claros, o dólar valorizado diante de uma moeda local favorece a exportação e torna mais caras as importações, enquanto sua desvalorização acarreta em consequências exatamente contrárias. Sendo assim, o Brasil, que assiste à uma forte desvalorização da moeda americana - em meados de 2002 um dólar equivalia a quase R$ 4,00, enquanto hoje a cotação está em uma média de R$ 1,70 - tem tido uma diminuição de suas exportações, um dos motores de sua economia.
Tomando o cenário econômico da China, onde o dólar encontra-se extremamente valorizado - um dólar equivale a  seis yuans - as exportações alcançam patamares altíssimos e, de certa forma, esta atuação revela-se incoerente e desleal com os outros países que disputam com os produtos chineses, pois lá quem define quanto o dólar vale não são as fundamentações em oferta e demanda - o chamado câmbio flutuante, que funciona no Brasil, por exemplo - mas sim o próprio governo chinês.

A esta altura você deve também estar questionando qual é a relação entre a cotação do dólar e as importações/importações. Para entender, veja a simulação abaixo*:

 1 -  Imaginemos que um dólar americano tenha as seguintes cotações:
  • no Brasil: 1 dólar vale 2 reais cada ou 1 real vale 0,5 dólar
  • na China: 1 dólar vale 4 yuans ou cada 1 yuan vale 0,25 dólar
2 - Uma empresa turca deseja comprar 100 computadores, que custam:

  • no Brasil: 10.000 reais
  • na China: 15.000 yuans
Obs.: nota-se que os computadores chineses são mais caros. 


3 - Com base nos preços de cada país, a empresa turca pagará pelos computadores os valores em dólares, que é a moeda internacional. Então os computadores, em dólares, terão o preço de compra:
  • no Brasil: 5.000 dólares
  • na China: 3.750 dólares
Obs.: mesmo os computadores chineses sendo mais caros em seu mercado local em relação ao Brasil, devido à alta cotação do dólar na China, eles se tornam artificialmente mais baratos.

* a simulação é bastante simplista, ignorando custo de mão-de-obra, tarifas de importação e outros índices que compõem a relação de importação e exportação entre diferentes países. Seu objetivo é somente trazer clareza sobre a influência da cotação do dólar na economia mundial.



Retornando, enfim, à questão da guerra cambial, esta se traduz em conflitos diplomáticos e econômicos de países que desejam que o dólar se valorize para que suas exportações sejam retomadas, em contraponto com a China, que concorre de forma desleal e, por fim, com os EUA, que tem adotado medidas bruscas e incisivas para expandir a circulação de dólar em sua economia, visando aumentar o consumo interno e a geração de empregos e, adivinhe, melhorar o desempenho de suas exportações. Levando em conta que  maioria dos países de relevância econômica no cenário global o câmbio é flutuante, quanto mais dólares os EUA colocarem para circular, menor será o seu valor no mercado internacional, o que alimentará um ciclo que pode gerar uma nova crise mundial.      
A guerra cambial se traduz em posicionamentos ambíguos sobre o dólar, onde há conflito quanto ao seu valor, que, estando alto, favorece a certos países e, estando baixo, prejudica muitos outros. Sendo que no meio destas oposições há a China, que manipula o valor da moeda americana ao seu bel prazer para vencer a concorrência de inúmeros produtos no mundo. 
Diante de tantos interesses, a única certeza é que esta guerra cambial não terá uma solução rápida e, ao que tudo indica, será um fator de risco para a quase nenhuma estabilidade do mundo econômico, já combalido pela crise de 2008, que se arrasta por mais de uma dezena de países. Vamos aguardar...

Escrito por Edward de A. Campanário Neto

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