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16 de nov. de 2010

Ensaios contra a morte

Crianças mexicanas ensaiam para reagirem a tiroteios em escolas*
Onde estão as respostas para as crises da humanidade? 

"No México me assusto com crianças sendo treinadas para sobreviverem a tiroteios dentro de escolas. São só crianças que já iniciam seu processo de adentramento e adestramento ao mundo tão difuso e díspar de suas realidades, muitas vezes ainda não maculadas pelos vícios que trouxeram e mantém a humanidade neste estado de barbárie."

É tão difícil olhar à volta ver o estado da humanidade, ver o quanto nos espreita o perigo e a desgraça que nasceu e é embalada por um sistema que a perpetua e a lança todos os dias em nossos rostos, trazendo dores para os que dela são vítimas e para aqueles como eu, que sonham com uma realidade tão diferente da que existe.
Confesso que somente uma certeza muito plena em um sentido divino para com a vida é que ainda me faz permanecer na tese de que vale a pena viver, ser desafiado pela morte e desgraça que todos dias espreita pela violência e por sem número de consequências advindas de modelos de governos humanos marcados pela corrupção, pela cobiça, pela frieza, pelo lucro, pelo ódio e pela cegueira em relação ao outro.
Vendo tudo isso eu fico a pensar  nos sentimentos de tristeza e até mesmo de ira do Criador diante do projeto amplamente rebelde e contrário dos seres humanos em detrimento de sua tão magnífica, perfeita e plena obra de coisificação da existência...
E é por estarmos tão distantes do ideal para que fomos criados é que nos entregamos ao caminho de nossas escolhas, capazes de conduzir cenários e rumos que nos impõem o poder da morte. Sim, o poder da morte dos sentimentos, morte do prazer de viver, morte do sono, morte da paz dentro do lar, morte de nossa confiança e, por fim, poder da morte física que nos ceifa de forma trágica e precoce da terra dos viventes.
É por tudo isso que vivemos em um mundo onde a vida se desfaz em um palco marcado tão profundamente pelos ensaios contra a morte. Nosso medo por ela é tão grande e sua possibilidade de nos ceifar é tão real, que nos vemos diante da necessidade de usar nossos artifícios contra ela, ensaiar cada ato para que não nos pegue de surpresa.
No México me assusto com crianças sendo treinadas para sobreviverem a tiroteios dentro de escolas. São só crianças que já iniciam seu processo de adentramento e adestramento ao mundo tão difuso e díspar de suas realidades, muitas vezes ainda não maculadas pelos vícios que trouxeram e mantém a humanidade neste estado de barbárie.
Sim, é muito chocante esta imagem, mas os ensaios contra a morte estão muito mais presentes em nossa realidade do que imaginamos. Para complementar o reino de horrores de um mundo que está morto, existem os seguros de vida - já que não temos segurança sobre como ficarão os que ficaram vivos -  seguros funerários, - já que não teremos certezas se haverá condições plenas para financiarmos o buraco onde se jogará o que um dia fomos -, cemitérios de luxo - para manter-mos nossa sina doente em criar um mundo nosso de ilusões, isso a custo da desigualdade - e, por fim, até modalidades de jogos de azar onde se aposta sobre quantos anos se viverá.
Se realmente atendêssemos ao apelo do Criador não precisaríamos deste mundo tão esquisito e, consequentemente, não haveria necessidades de ensaios contra a morte. A morte tomaria de novo o seu real sentido, o sentido de uma etapa da existência para algo eterno. Não temeríamos a morte...
Somente olhares para uma vida de simplicidade e uma prática que nos arranque de todos os vícios que lançaram o mundo neste abismo de desgraças é que nos libertará dos sons dos grilhões da morte sobre nossos passos.
Certa vez, falando sobre a vida, Jesus vislumbrou esta prática, nos deu o caminho para alcançar esta consciência e este rumo tão simples, mas tão necessário desde seus tempos até os dias de hoje:

"Por isso vos digo: Não estejais ansiosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer, ou pelo que haveis de beber; nem, quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo mais do que o vestuário?
Olhai para as aves do céu, que não semeiam, nem ceifam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não valeis vós muito mais do que elas?
Ora, qual de vós, por mais ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado à sua estatura?
E pelo que haveis de vestir, por que andais ansiosos? Olhai para os lírios do campo, como crescem; não trabalham nem fiam;
contudo vos digo que nem mesmo Salomão em toda a sua glória se vestiu como um deles.
Pois, se Deus assim veste a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós, homens de pouca fé?
Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que havemos de comer? ou: Que havemos de beber? ou: Com que nos havemos de vestir?
(Pois a todas estas coisas os gentios procuram.) Porque vosso Pai celestial sabe que precisais de tudo isso.
Mas buscai primeiro o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.
Não vos inquieteis, pois, pelo dia de amanhã; porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal."

Mt. 6.25-34

* Fonte: Portal G1

Escrito por Edward de A. Campanário Neto
    

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