Páginas

27 de out. de 2010

O luxo nos torna egoístas

Estudos comprovam: o luxo desperta o individualismo

"Sem sombra de dúvidas, enquanto eu digito esta postagem, milhares de pessoas no mundo todo estão, agora, sendo muito bem pagas para pensar formas e métodos de otimizar os lucros de suas empresas através de campanhas publicitárias milionárias e marketing oculto. Há também práticas em busca de brechas legais para explorarem a força trabalhadora, depredarem o meio ambiente e desrespeitarem as leis. Na esmagadora maioria das vezes, tais campanhas nos induzem, inconscientemente, a mudar nossos valores em adoção de uma mentalidade que visa o consumo como meta de realização pessoal."


Roy Chua (na foto), Ph. D em gestão pela Columbia School (EUA), hoje professor de Harvard, acaba de divulgar uma pesquisa que traz dados impressionantes sobre o poder de persuasão que o luxo tem sobre nossa cognição, principalmente na elevação de nosso teor de egoísmo.
A pesquisa avaliou as decisões tomadas por 800 universitários após serem expostos a uma série de imagens, que foram divididas em duas seções, uma de produtos luxuosos e outra com objetos baratos e de segunda mão.
As perguntas continham questões onde a decisão apontada pelo o entrevistado trazia ou não riscos às outras pessoas e consumidores, como aponta o próprio Chua: " Para responder ao questionário, as pessoas precisavam tomar decisões. Algumas poderiam até prejudicar outras pessoas, mas aumentariam, ainda que de forma pouco ética, o lucro das empresas. Perguntamos se a pessoa colocaria no mercado um carro com possíveis problemas mecânicos, lançaria um software com falhas ou um jogo de videogame que induzisse à violência."
O resultado das respostas obtidas foi bastante interessante. Os estudantes expostos às imagens de luxo e ostentação demonstraram posições egoístas, visando o claro interesse pessoal. Já as respostas dos outros universitários, que tiveram contato com produtos simples, apontaram para decisões mais responsáveis e sensatas. Dentre o grupo que observou as imagens de luxo, quatro em cada cinco optaram por lançar no mercado produtos que aumentariam os lucros da empresa, mesmo que estes trouxessem riscos à sociedade.
O nível de individualismo foi confirmado por mais dois testes realizados na pesquisa: "No segundo experimento, camuflamos algumas palavras num emaranhado de letras. Elas tinham sentidos opostos, como “gentil” e “rude”. Ao pedir para que as pessoas identificassem essas palavras, a maioria dos expostos ao luxo escolheu as palavras negativas. No terceiro experimento, usamos duas situações: uma em que a pessoa deveria contribuir para resolver um problema público, outra em que poderia se beneficiar de dinheiro público. O grupo exposto a artigos de luxo deu menos e pegou mais do que o outro grupo." A pesquisa nos mostra os males da exposição ao mundo globalizado e à cultura do consumo, mas não detém o mérito de descobrir algo novo. Afinal, o professor Chua só confirma a atualidade dos termos de fetiche e alienação expostos na teoria marxista desde os meados do século XIX.
Apesar de haver cenários diferentes entre 1867 e hoje, fica bastante claro que a burguesia apontada por Marx como a detentora e manipuladora do saber e criadora dos fetiches capitalistas, não se diferencia em nada da mídia e indústria de hoje, que conhecem muito bem as estratégias, tanto sociais quanto cognitivas para nos induzir a comprar e desenvolver comportamentos.

Bem à frente de seu tempo, Marx refletiu sobre o poder exercido pelas classes dominantes através do fetiche


Sem sombra de dúvidas, enquanto eu digito esta postagem, milhares de pessoas no mundo todo estão, agora, sendo muito bem pagas para pensar formas e métodos de otimizar os lucros de suas empresas através de campanhas publicitárias milionárias e marketing oculto. Há também práticas em busca de brechas legais para explorarem a força trabalhadora, depredarem o meio ambiente e desrespeitarem as leis. Na esmagadora maioria das vezes, tais campanhas nos induzem, inconscientemente, a mudar nossos valores em adoção de uma mentalidade que visa o consumo como meta de realização pessoal. Consequentemente, a busca por esse mundo de ilusões criado por tal consumo nos torna simples fantoches dos grandes conglomerados industriais e comerciais, que nadam em fortunas, ao custo da exploração de trabalhadores.Não é fácil resistir ao bombardeio diário de milhares de mensagens que enaltecem o poder e o luxo. As gerações mais recentes são frutos de tal processo, inclusive os jovens, que se encontram, em sua maioria, preocupados somente em viver a suposta maravilha do mundo do consumo. Isso é terrível, pois gera um círculo vicioso onde há domínio supremo da mídia do consumo, que leva ao abandono das ideologias de ruptura. Sendo assim, por não haver repressão da alienação na sociedade, é aumentado ainda mais o poder do consumo sobre as pessoas, realimentando todo o processo.É impressionante o poder que a mídia tem sobre nós, a geração da televisão e internet. As campanhas publicitárias dominaram como nunca as técnicas que nos levam a comprar algo sem haver necessidade e, no fundo, sem sequer sabermos por que compramos. Crescem  absurdamente as grifes e produtos de luxo, que se tornaram o sonho utópico das classes populares.As grandes empresas e bancos aprenderam a mover nossas mentes e corações. As propagandas veiculadas no emocionam, nos alegram e, sem nós sabermos, fazem toda a diferença na hora de sermos mais ou menos individualistas. O grande desafio da esquerda hoje, principalmente junto às gerações de jovens, é fazer cair as membranas da dominação pelo consumo, que simplesmente cegaram a humanidade. É evidente que é algo quase que insuperável, mas que tem que ser levado a cabo a todo custo, pois o mundo já sofre as consequências desse capitalismo desenfreado. O aquecimento global é a maior prova de que esse modelo de desenvolvimento só aponta para a destruição!

Gramsci, pensador comunista italiano, deixou claro que a guerra ideológica na sociedade se trava inicialmente no interior de cada um, onde disputam o homem biológico (egoísta por natureza) e o homem político. O homem político, para ele, é a superação dos instintos egoístas humanos em função da adoção de um sentimento que visa, primordialmente, a necessidade de sobrevivência e bem-estar de todos.
Partindo do princípio apontado por Gramsci, a função dos partidos de esquerda é criar um ambiente onde o indivíduo se enxergue como a parte de um todo, que é a sociedade e, consequentemente, preze por ela, colocando-se em segundo plano.

Gramsci , nos Cadernos do Cárcere, delineou pontos importantes na condução da revolução socialista. Só a ideologia poderia libertar o mundo da opressão capitalista.

Isso só se conquista no campo das ideias, onde o diálogo do indivíduo consigo mesmo tem de ser mediado pelas ideias de igualdade, revelando a grande ilusão criada pelo capital.
Paulo Freire, educador brasileiro histórico, nos ensinou muito sobre a autonomia do ser humano diante da sociedade que lhe é apresentada. Ele trilhou o caminho da pedagogia para alcançar esse ideal. Fez da educação uma arma para que as classes populares não se construissem no desejo do consumo e da acumulação de riqueza, mas na luta pela superação das injustiças que as condenaram à pobreza e exploração. É um rompimento revolucionário ver as massas lutando por direitos de igualdade ao invés de buscarem nos seus opressores o caminho para ascenderem a um lugar de conforto na cruel pirâmide social do capitalismo.

Paulo Freire, em Pedagogia da Indignação, apontou como se dá o domínio sobre as massas: o oprimido introjeta a sombra do opressor

Hoje existem muitos críticos do socialismo e da igualdade, baseados principalmente na visão racionalista de que não somos iguais e que a sociedade socialista é impossível pelo egoísmo natural do ser humano. É verdade que não somos iguais e que, sim, somos individualistas, mas que racionalidade há no estado de miséria e pobreza que se vê no mundo? A produção de riqueza cresceu geometricamente nos últimos séculos, mas nunca existiram tantas pessoas vivendo em situação de extrema miséria como agora. Isso parece racional?


Enquanto cresce o mercado de luxo no mundo todo, mais de um bilhão de pessoas sonha em somente poder comer 3 vezes ao dia

Escrito por Edward de A. Campanário

Nenhum comentário: